Nosso GMI no Arizona, Estados Unidos, o professor Gustavo Dantas é especialista na técnica de fortalecer a mente dos atletas da arte suave. Após muitos anos de estudo e experiências práticas, Gustavo listou e analisou os principais erros que costumam sabotar a mente do lutador de Jiu-Jitsu. E passou a desenvolver soluções muito eficientes para você evitar essas falhas.
Num primeiro momento, o professor da GD Jiu-Jitsu Academy oferece um questionário para que o atleta possa reconhecer algumas características psicológicas a serem aperfeiçoadas. Em seguida, o professor ataca as falhas individualmente, pessoalmente ou via uma série de vídeos desenvolvidos para quem nunca mais quer sofrer “travas mentais” quando estiver sob pressão, seja um competidor ou um praticante com outra profissão desgastante mentalmente. Confira o que aprendemos com Dantas, neste bate-papo.
GRACIEMAG: O que é a pressão psicológica para você, professor, e por que isso ocorre repetidamente no esporte – e até mesmo fora dele?
GUSTAVO DANTAS: Eu nesses anos todos de estudo aprendi que o principal erro do lutador, e do ser humano de modo geral, esportista ou não, é depositar toneladas de expectativas em algo que a pessoa não tem o menor controle. É aquela neurose típica de concentrar todos os seus pensamentos na vitória, “não posso perder, só posso ganhar”, como se não houvesse outras pessoas com o mesmo objetivo que você, que podem ser mais talentosas ou mais esforçadas que você. A medalha de ouro pode ser um objetivo e até mesmo um sonho, mas não depende somente de você, e sim de uma centena de outros fatores. Eu comecei a aprender sobre isso há décadas. Afinal, precisei entrar em seis campeonatos de Jiu-Jitsu diferentes até conseguir ganhar a primeira luta, a partir da faixa-azul. De travar ali em competições então acho que entendo, pois senti na pele. O que acontecia? A cada nova tentativa, eu entrava com um fardo maior pesando nos ombros e nas costas: “Já perdi aquela, desta vez não posso voltar sem uma vitória pelo menos…” Isso prejudica a cabeça de qualquer pessoa. Claro que eu perdia por uma série de outras falhas técnicas, mentais e de treinamento, mas o melhor caminho para acertar é uma mente leve, sem uma sobrecarga inútil de pensamentos nocivos.
Como esvaziar então a mente?
É um processo constante de limpar a cabeça e evitar que aquelas perguntas fiquem martelando você. Eu chamo esse nosso inconsciente de “passageiro obscuro”, aquela voz que fica ali levantando as questões mais incômodas na hora mais errada: “Será que você é bom o suficiente?”. “Ih, aquele oponente ali vem ganhando tudo, como você vai ganhar dele?”. “E se perder, o povo vai ficar decepcionado contigo, hein…” Há, nesse ponto, uma notícia ruim e uma boa sobre isso: esse “passageiro obscuro” vai ser companheiro para o resto da vida. A boa, no entanto: é possível controlar esse fluxo de dúvidas e questões negativas. O primeiro passo, portanto, é reconhecer a voz prejudicial assim que ela surgir. A partir daí, você passa a gerenciar todas essas emoções. “Peraí, deixa eu administrar aqui esses pensamentos. Isso eu já estou ligado que é besteira, sai. Isso eu arquivo. Isso é o pensamento certo, vou com ele”… Autoconsciência é o segredo. E isso é um processo que você “treina” todos os dias, todas as horas da sua vida.
Ansiedade, tensão, apreensão em excesso… Como ensinar a domar esses obstáculos que estão na vida de qualquer adulto, de qualquer atleta?
O procedimento principal é aprender a aproveitar o momento. Você está com saúde? Tem seu kimono para treinar? Tem um professor? Aprenda a apreciar o que já tem, e os momentos bons. O que atrapalha é focar nos maus sentimentos, e não em tudo de bom ao redor.
Eu sou um lutador que vai competir agora no absoluto, mas estou nervoso demais. O que você me diria?
Quando alguma sombra de dúvida passar pela sua cabeça numa hora decisiva, você precisa ajustar esse problema na hora, como uma mão perigosa que entra na sua gola. “Pare tudo e reflita: você tem o controle sobre o resultado final, sobre o árbitro, sobre o que o rival vai fazer? Claro que não.” E aí é só entrar para realizar o que depende de você, do que você sabe e o que treinou. Só o seu dia a dia, ou seja, o seu processo diário, o que chamo de “agora”, interessa. Alimentação, sono, preparação física são suas chaves do sucesso. O resto virá se você realmente quiser muito.
É um mecanismo idêntico, portanto, para o cara que luta ou seja lá qual for a profissão dele, certo?
Exatamente, porque a gente vê isso a toda hora. Por que a pessoa talentosa ou sábia trava? Imaginemos um cara que estuda para concurso, está na maior pindaíba, precisa de dinheiro e estudou por meses a fio. Ele não controla se será aprovado ou não, pois há outros concorrentes ali na mesma situação, com o mesmo merecimento. Mas se ele entra para fazer a prova pensando no dinheiro, na obrigação de passar, ele já começa a ver os ombros numa tensão muscular que pesa uma tonelada. Fica branco e a boca seca. E, mesmo sabendo as respostas, a cabeça dele dá branco. Então gerenciar os pensamentos que viajam com você na sua cabeça é fundamental para tudo. E precisamos nos policiar o dia inteiro contra essas negatividades.
A respiração é fundamental?
Sim, quando a negatividade chega, o primeiro passo é estar ligado nisso. O segundo é respirar por um tempo. E voltar para o presente, para o agora. A capacidade de se concentrar no agora, no que você pode realizar neste exato instante, é o grande segredo dos supercampeões de qualquer modalidade, nos personagens célebres de qualquer época.
Qual é, então, a receita principal para ter uma mente positiva e vitoriosa?
Visualize uma chave de campeonato de Jiu-Jitsu, um Mundial: quantos ali estão num estado mental 100% idêntico a um dia qualquer na academia? Poucos? Provavelmente nenhum? Bem, mas se estivessem pode ter certeza de que a atuação desses daria um salto espetacular. Por isso o trabalho mental é importante. Mas o que faz o lutador que sucumbiu à pressão retornar, como eu procurei fazer após minhas derrotas? A vontade de estar lá, o amor por aquilo. O principal é amar o que você faz e ter realmente a vontade de ser melhor a cada dia, sem dar a honrarias e ao reconhecimento um peso excessivo. A partir dessa paixão e certeza do que você ama fazer, você consegue parar, respirar e analisar cada aspecto que possa estar atrasando seu desenvolvimento.
Um dos casos mais comuns que nossa equipe escuta é: “Ih, fulano era muito melhor na academia que nos torneios…”. Ou, porventura, o oposto. O cara comum na academia que virava um leão nos campeonatos. São esses os aspectos que você costuma analisar?
Sim, normalmente os atletas que vêm a mim para afiar o condicionamento mental respondem a uma série de questionários. Por exemplo: ele duvida de sua capacidade? Está preocupado com o que pensam dele? Tem medo de desapontar familiares e equipe? Tem um medo de errar que o paralisa? A alegria de viver do atleta está totalmente ligada ao êxito esportivo? Ele cria rótulos negativos o tempo todo, como “Eu canso em finais”, “Jamais consigo raspar…” Mas a principal pergunta é a última: é sobre o desejo de ser o melhor a cada dia no que faz. Se o camarada tem isso dentro dele, a partir dali a mente dele pode ser blindada contra qualquer fraqueza.
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